terça-feira, 4 de junho de 2019

nadar, incessantemente nadar
rumo ao nada, vazio
para morrer, incessantemente morrer
na terceira margem do rio

passear, como quem luta,
por essa vi(d)a,

em um lugar qualquer
entre a realidade e a imagem
miragem
vi(r)agem

domingo, 6 de janeiro de 2019

Diante do cálamo
calo-me

cala em mim
e calco-me

pulverizo-me até à cal.
Diante do cálamo

mudo.
A pena pesa sobre os ombros

calos
e calombos.

Diante do cálamo
calamidades e escombros

diante do mundo
mudo

sábado, 29 de setembro de 2018

A palavra mentira

acredita no que digo
errante leitor(a)
pois não é senão a mais pura
mentira:

e mesmo a pretensa verdade
que o que te digo agora encerra
não se compõe senão de minha matricial mentira:

suicida mentira
ao tentar dis-simular a dissimulação
discursa o dis-curso.

o ímpio movimento de arrancar o véu
da grã-mentira que sou eu própria...
no gesto mesmo de te libertar radicalmente
da falsidade que meu corpo morto impõe
só se define ao te encerrar outra vez no engodo que a palavra é


domingo, 6 de maio de 2018

traz a voz
presa na garganta
a voz em nós
em nódulos imensos
homens pensos
pomos tensos

algo quer falar
logo se envergonha
se con-trai

o caldo quente
e torvo, como a tinta vermelha
que mina a cabeça de um corvo,
não cessa de escorrer-se
nós de dedos e mãos,
crispados, vãos

a modular o grito
em insanas melodias

sábado, 31 de março de 2018

Ao escrever
me correspondo contigo mundo mais livre...
Já existe?

Digo simplesmente que hoje choveu a cântaros?
Molhar-me nessa água?
Sorver toda chuva?

(todo poema estar por acabar)

Escrever sequer existe? Sem lei
é bom e ruim flagrar-se estúpido
diante de versos

No convívio diário
abro mão de todo verbo

Insisto porém na maldade de escrever sem saber.