domingo, 11 de novembro de 2012

Qualquer verso

Queria só um verso certeiro que fosse

Procuro, perscruto
E cato e cato e cato
Mas tudo é tão chato

Que dá sono na minha poesia

sábado, 3 de novembro de 2012

Possível continuação para "Tempo Perdido"

Meu dia ordinário fora marcado por aquele sujeito de óculos grossos, que talvez não fosse velho, mas que com certeza tinha os olhos voltados para o passado. “Um extremista!”, como disse Supertramp. devia ser mesmo um desses sujeitos que vertam lágrimas sinceras ao sabor de filmes vespertinos. Achara-o inconveniente. De fato o fora, qualquer pessoa que conhecesse a história poderia manifestar-se a meu favor. Meu pensamento ironicamente objetivo não conseguia responder a pergunta que provavelmente vinha de outra ala da consciência. Por que um sujeito com rugas fundas e lábios trêmulos havia me comovido tanto, a ponto de me deixar triste, ou pelo menos pensativo? Eu por acaso já não sabia que o mundo era cheio dessas histórias de naufrágios e guerras, amores e desamaores?

Em um dia comum eu tomaria meu caminho natural, pegaria o metrô de todos os dias, e atravessaria sonolento aquele percurso que já não me entediava mais, uma vez que até o tédio chega a um grau neutro, onde não lhe é mais permitido avançar. E assim seguiria para o meu apartamento abarrotado pelos meus apetrechos e pensamentos de adulto recém-independente. E então, depois da ducha talvez pegasse o telefone e ligasse para uma puta, ou para um amigo. Ou ainda, talvez fosse para um bar onde beberia vinho ruim distraidamente. Minha vida.

Mas não nesse dia. Esse dia que por sua própria natureza estranha me tornava um imigrante em mim mesmo, um retirante. E então eu olhava para os meus minutos e horas com melancolia. E quando acendi um cigarro, meus namoros shakespearianos, meus relacionamentos sinceros nunca acontecidos, brotaram suavemente de uma memória que eu ignorava. E de súbito, eu podia sentir o frio metálico dos aros dos óculos marcando minha fisionomia cansada. Podia sentir meu coração confrangido. Então desci. Um amor que parecia mesmo real começa a revolver dentro de mim, iniciando no centro dos pulmões, avançando, e irrigando minhas mãos suadas. Era noite, e eu, um dândi deslocado de minha época. Um gentleman perdido em um bairro boêmio. Então avancei com minha roupa antiquada e minha maneira desagradável de mirar dentro dos olhos de estranhos.
A essa altura, a metamorfose já era quase completa. Eu já podia lembrar com precisão cirúrgica todos os trejeitos de minha amada que certamente descansava intocável no alto de alguma torre desta enorme cidade. Minha voz tão tímida não conseguia alcançá-la. Eu só podia continuar caminhando. Pois minha serenata não fora ouvida, meu convite mudo não fora compreendido, e já não havia mais flores a serem decodificadas.

Ela pairava com seus livros, de princesa, ou niilistas; suspensa diante de meus olhos sonolentos. Seu gesto de veludo vinha me roçar num banco de mármore de alguma praça católica. E seu perfume iludia minha razão, e sua tatuagem miúda parece que marcava a ferro minha retina. E eu me encantava cada vez mais por aquela pele morena. Sendo esse o nível mais profano de meu sentimento, que outra vez se tornava casto. Então eu claudicava pelos bairros, pelas ruas carecendo daquela mulher. Que aparecesse e salvasse do aniquilamento esse amor tão franco. Mas há essa hora tardia, como achar minha dama? Ainda mal parafraseando o poeta: chega uma hora que toda a cidade dorme. Mas meu coração em brasa persiste.


Texto inicial "Tempo perdido" de Barbara Oliva (Novo Austro)